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Porque falamos sobre as coisas que falamos?

Porque falamos sobre as coisas que falamos?
Photo by Volodymyr Hryshchenko / Unsplash

Eu sempre busquei uma explicação para tudo e 'por que?' é uma das perguntas que eu mais fiz na vida. Então, para um profissional de marketing apaixonado, entender a razão pela qual algumas iniciativas conseguem mais boca-a-boca, ou ~viralizar~, em termos mais atuais, me parecia uma boa leitura. Compartilho aqui a minha interpretação e principais aprendizados do livro "Contagious - Why Things Catch On", do autor e professor Jonah Berger*.


Pra resumir o livro em um parágrafo curto, grandes ideias de produtos e campanhas são como queimadas na floresta: algumas são muito maiores que as outras, mas o tamanho em si não é definido pela faísca que as causou. E mais, você até pode identificar onde e como tudo começou, mas precisam existir muitas árvores e galhos de tamanhos variados para primeiro pegar fogo e depois passar as chamas para frente. Conseguir um bom boca-a-boca é como tentar começar uma queimada. E nós somos as árvores e galhos que passam ela adiante.

Quem aí não busca avaliações ou resenhas na internet, comentários em redes sociais e outras fontes de pesquisa antes de decidir se aquele produto vale ou não a pena antes de comprar? Mas o professor traz em seu livro uma informação que me explodiu a cabeça: de acordo com sua pesquisa, somente 7% do boca-a-boca acontece online. Claro que as conversas na internet, quando públicas, têm um potencial muito maior de alcançar muita gente (alô, #recebidos), mas justamente porque sermos bombardeados por informação nova de todos os lados e a todo momento, é simplesmente impossível estar a par de tudo. Então, se não é relevante, a gente esquece.

Além disso, essas conversas online tendem a ser mais polidas: sempre temos a chance de reler o que escrevemos antes de apertar o 'enviar' ou 'postar' - e muitas vezes editamos ou até deletamos depois de postar. Na vida real, porém, é impossível desfalar. Talvez por isso, mesmo podendo falar sobre literalmente qualquer coisa, acabamos sempre escolhendo os mesmos temas - o tempo, aquele filme ou série que assistimos outro dia, o resultado do jogo de ontem, pra onde vamos nas férias... a não ser que nos ajude a passar uma mensagem específica sobre nós mesmos.

Tá bom. Então por que a gente fala sobre algumas coisas e não sobre outras?

De acordo com o livro, conversas são pautadas por ao menos um de seis princípios fundamentais:

  • 🪙 Moeda Social: como é que você faz pra saber se um cara gosta de cerveja artesanal? Não se preocupe, ele vai te falar. Brincadeiras à parte, principalmente por causa do FOMO (Fear Of Missing Out), nós tendemos a falar sobre coisas, lugares e produtos que passem uma imagem positiva sobre nós, que elevem nosso status ou que nos deixem bem na fita. Por exemplo, para um profissional de marketing, saber sobre o que aconteceu no último SXSW é importante para ficar ligado no que vem por aí, mas ao falar sobre isso, ele mostra para sua rede que é um cara atualizado e que manja dos paranauê. Ninguém ganha moral com os amigos quando chega no churrasco falando que comprou aquela fraldinha no Extra e que estava em promoção. Agora, o sujeito enche o peito pra falar que conhece uma casa de carnes - açougue não, casa de carnes - lá pertinho da casa dele, que vende uma carninha espetacular. Pontos extras se o churrasco for na casa dele. Então, é preciso entender que, para um bom boca-a-boca acontecer, a coisa precisa ser sobre quem passa a informação adiante, não sobre o produto em questão. Falar sobre seu produto/ideia faz com que a pessoa passe uma imagem positiva sobre ela própria? Será esse produto/ideia tem um elemento de gamificação que incentiva as pessoas a continuarem usando ou comprando para se destacarem no seu círculo (pensa no app de corrida da Nike que faz um ranking mensal entre seus amigos e que tem uma sistema de cores/níveis, onde você vai sendo promovido ao correr certas distâncias)?
  • 💥 Gatilhos: certos assuntos despertam na gente uma reação quase que automática, e nós trazemos à tona para a conversa aquilo que está ali mais fresco - ou que tem conexões mais fortes - na nossa memória. Pensa na quantidade de temas que passam por uma roda de amigos. Prever quais assuntos vão ser falados é impossível, mas, como profissionais de marketing, entender esses gatilhos é essencial para aumentar a exposição orgânica de nossas marcas e participar dessas conversas quando elas acontecerem.
  • ❤️‍🔥 Emoção: excitação, humor, raiva e ansiedade, por exemplo, causam uma sensação de alerta, desejo, mobilidade ou prontidão a agir. Nós compartilhamos o que nos desperta algum tipo de sentimento, estímulo ou sensação. O objetivo normalmente é ou provocar no outro a mesma emoção ou evitá-la completamente. Sua campanha ou seu produto provocam alguma emoção? Como você faz as pessoas se sentirem quando pensam nela/nele?
  • 📢 Público: uma das principais tarefas de um profissional de marketing é tornar público o privado. Somos seres visuais e não prestamos muita atenção no que não está à vista. E é por isso que a fundação Movember é um baita de um exemplo aqui: ao encorajar que os homens deixem o bigodão crescer todo mês de novembro, centenas de milhares deles ajudam a aumentar não só a consciência a respeito de sua saúde física e mental - algo que é certo tabu em nossa sociedade - mas também incentivam doações para diversas causas e projetos, da conscientização sobre a importância do exame de toque até a prevenção do suicídio; a Apple quebrou paradigmas com seus fones de ouvido e fios na cor branca e fez com que as pessoas publicamente assumissem que tinham um iPod; as pulseiras amarelas LiveStrong eram facilmente reconhecidas - além de promover certa moeda social. Quando o privado se torna público ele atrai a curiosidade, e é por isso que restaurantes sentam seus primeiros clientes na janela e colocam a área de espera logo na entrada, pois isso faz com que, de fora, pareçam cheios. E um restaurante cheio deve ser bom.
  • ✅ Valor Prático: informação útil é compartihada mais frequentemente. Se é um hack, algo que faz com que as pessoas economizem tempo, dinheiro, se tornem mais saudáveis (de maneira prática) ou simplesmente uma promoção bacana, valor prático é sobre ajudar o próximo. E nos sentimos bem se sabemos que ajudamos um amigo. Seu produto ajuda as pessoas a se ajudarem?
  • 📖 História: somos tão acostumados a contar histórias que tornamos qualquer coisa em uma pra poder passar pra frente. Até as resenhas de produtos que pesquisamos na internet, ao invés de serem de fato resenhas, acabam sendo uma grande coleção das mais diversas experiências que as pessoas tiveram com tal produto. Onde poderia tranquilamente estar escrito "acabamento ruim", ou "produto de má qualidade", se transforma em "dei de presente para meu filho porque ele queria muito, mas acabou quebrando da primeira vez que ele brincou".

Desde que eu li o livro, esses 6 princípios entraram de vez para meu cinto de utilidades do marqueteiro. Se você também é um, espero que esse texto tenha te provocado de alguma maneira e feito pensar. Porque, no fim das contas, quando a comunicação coloca verdadeiramente o cliente no centro de tudo, conseguir aumentar essa exposição orgânica via boca-a-boca é só uma consequência. Quem não vai recomendar um bom tênis de corrida, ou um restaurante incrível ou passar pra frente uma informação sabendo que pode ser útil para um amigo?

Se quiser conversar sobre o tema, me adiciona lá no LinkedIn que eu quero ouvir sua opinião!

*o livro também existe em português também aqui.